13/05/2010

Achei bem esperar pelo 13 de Maio para escrever sobre este tema.

Não sou católica. Tive uma educação baseada em princípios católicos, andei num colégio católico, fui baptizada, fiz a Primeira Comunhão, andei na catequese. Ia à missa todos os domingos e aquilo fazia sentido: aquelas histórias, aquelas palavras, os valores. Mais do que um complemento à minha educação, aquilo era um complemento à minha formação.
O Padre Jardim era o culpado disto tudo: fazia uma missa especial para crianças, ajudava-nos na confissão e tratava todos os meninos pelo nome. Perguntava se nos tínhamos portado bem na escola, se ajudávamos a Mãe em casa e se brigávamos muito com os irmãos. Contava-nos as histórias da Bíblia como se fossem histórias de encantar ou contos modernos. Ensinava-nos a respeitar o próximo, quem quer que ele fosse. E nunca se esquecia de ir ver-nos nas festas de Natal ou de final de ano lectivo.
Até que chegou o dia em que o Padre Jardim foi embora: sabíamos que tinha ido para outra paróquia, mas éramos muito pequenos para perceber que Carnide fica mesmo aqui ao lado e que a mudança nem sempre traz algo de bom. Com o Padre novo era tudo uma seca e tínhamos imensas coisas para decorar e dizer todos ao mesmo tempo durante a missa. As músicas não eram aquelas que conhecíamos e já não tinham palmas. Para mim, toda a Igreja se tornou sisuda e só ouvia falar de castigo e penitência.
Mais ou menos por esta altura, lidei pela primeira vez com a dura realidade da morte. Sim, as pessoas morriam, mas era lá longe, nos filmes e nas novelas. Como é que, de repente, aquela pessoa que eu via todos os dias podia simplesmente desaparecer? Aquele mesmo Deus com quem eu estava a zangar-me permitiu que isso acontecesse a mim: que sempre tinha ajudado a minha Mãe, que fazia sempre os trabalhos de casa!
Zanguei-me definitivamente com Ele. Mais tarde, ainda houve uma tentativa de reconciliação, quando conheci Roma (quem é que não se torna católico em Roma?), mas logo a seguir outra rasteira ainda mais cruel, ainda mais injusta e tornei-me definitivamente ateia.

No sábado passado, tive uma das maiores (e melhores) surpresas da minha vida. Fui ao casamento do meu amigo mais antigo, que por acaso casou com a minha prima. E qual não é o meu espanto quando vejo, na sacristia, o Padre Jardim. Quando fui dar-lhe um beijinho, ele disse "lembro-me tão bem desse sorriso, mas já não me lembro do nome; afinal, já lá vão 20 anos...". Confesso que fiquei comovida.
Foi uma cerimónia bonita, e, naquele momento, voltei a ter 10 anos e tudo voltou a fazer sentido: o Padre Jardim estava a tratar-nos pelo nome e batemos palmas a cantar. Apesar de não ter conseguido assistir à cerimónia toda (não tinham nada que casar na hora do lanche do esfomeado do meu filho) posso dizer que foi um dos casamentos mais bonitos que já vi.

Gostava que o meu filho conhecesse a Igreja que eu conheci e vivi com o Padre Jardim. Tenho a certeza que faria dele um Homem melhor.

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