30/04/2016

Dilar

A Dilar era uma senhora que trabalhava lá em casa quando eu era pequena. Eu sofria de amigdalites e, de 15 em 15 dias, lá ia eu ao Centro de Saúde para uma injecção de penicilina. Desta minha condição de saúde, a Dilar insistia em dizer à minha Mãe:
- Isto só pode ser mau olhado, Senhora Professora. Vá por mim que é mau olhado.
- Não diga isso à frente da garota, Dilar, que ela ainda acredita nessas coisas - sorria a minha Mãe.
- Ah, mas é mesmo para acreditar!
E, de quando em vez, mais vezes do que era normal, lá vinha eu ao colo do meu Pai, sem conseguir andar, depois de mais uma injecção.

Esta semana, pensei muito na Dilar. Eram quatro dias de férias planeados e divididos em arrumações e em fazer nada. Muito fazer nada. A primavera, finalmente, chegou, os miúdos não vão ao médico há quatro meses, o segundo aniversário da T para comemorar e organizar, tudo corria de feição. No dia dos anos dela, segundo dia de férias, ligaram da escola: que tem febre, que não come, que está xoxa. Partir daí, abortaram-se todos os planos: a T não sai do colo.
Há seis anos que é assim: quando tiro uns dias de férias só para mim, há sempre um filho doente. Não é às vezes, é sempre! E a Dilar na minha cabeça:
- Isto só pode ser mau olhado.

Se eu acreditasse nestas coisas, daria razão à Dilar. Como não acredito, fiz brigadeiros. Porque não há nada como uma casa a cheirar a chocolate para nos aquecer o coração pequenino de Mãe.

27/04/2016

27/4

Vocês lembram-se: eu queria mesmo outro rapaz e fiquei em choque quando soube que vinha uma menina. Depois, veio a confusão do nome, a epopeia que foi encontrar um que gostássemos, as discussões que houve à volta disto. Depois chegou o grande dia e foi aquele Amor. O Amor que não se divide pelos filhos que se tem, mas multiplica-se logo que os sabemos dentro de nós.
E ela cresce rápido e fala e explica-se e corre e come tudo e muito. E é torta e teimosa e independente. Mas depois, olha-nos com aquela denguice que eu nunca vi nos rapazes e perdoamos (quase) tudo. Há quem diga que eu precisava de uma menina na minha vida. Que ela só me fez bem. Que foi ela quem conseguiu ressuscitar o meu lado feminino. Ela só me faz bem, é certo. O resto, quem sabe?

"Esta miúda é um exagero", canta o Jorge Palma. Deve ser a frase que mais vezes me passa pela cabeça quando a olho. Um exagero no que come, na cumplicidade com o Manuel, na protecção que procura no António, na concentração a fazer desenhos, na precisão a construir legos, na velocidade com que corre pela casa, na alegria quando me vê. Esta miúda é um exagero no Amor que lhe tenho, no mimo que trocamos, na atenção que me pede. E é um exagero tão bom...

Esta é a minha miúda e faz hoje dois anos. Dois anos de covinha na bochecha e olhos que mudam de cor.
Dois anos de Little Miss T.


21/04/2016

Em silêncio.

As palavras que nunca te direi podiam mudar tudo. 
Não adoro mudanças. Adapto-me bem a tudo, mas não gosto de sair do conforto do conhecido. Arrisco, por vezes, mas não me é fácil. 
A experiência e a idade já me fazem prever alguns embustes com clareza. Nem sempre quero fugir deles. Sei o meu lugar em cada um dos papéis que desempenho. Sei que vou cair ao aterrar. A dúvida é saber se voo ou se fico em terra. E todos os dias mudo de ideias. Hoje, decidi voar. Amanhã, quem sabe?
As palavras que nunca te direi vão ficar num rascunho bem guardado. Bem junto de tantas outras mudanças que nunca chegaram a acontecer. 
Enquanto voo, aprecio a vista. Em silêncio.


07/04/2016

Um mês de sportv cá em casa, dá isto.

Eu diria que jogar à defesa é mais seguro. Mas isso sou eu que sou uma medricas e arriscar, para mim, é uma palavra que só existe no dicionário. Quem percebe do assunto, no entanto, saberá que jogar à defesa é típico da equipa insegura: o jogo confortável, monótono, entediante até. 
A equipa que ganha tem mais confiança para jogar ao ataque. A auto-estima e o conforto do resultado permite-lhe, lá está, arriscar. Há espaço para brilhar e, com alguns bafos de sorte, a probabilidade de fazer um jogo memorável é grande.
Já a fazer o efeito oposto está o excesso de confiança: rouba a atenção dos jogadores para detalhes importantes, às vezes óbvios. Erros de palmatória que, num segundo, viram o resultado. Já se perderam campeonatos assim. Mesmo que os adeptos perdoem, a equipa estará ferida para sempre. 
Posto isto, qual é a melhor táctica de jogo que um treinador pode adoptar? Qual o discurso nos minutos que antecedem a partida? Dependerá, a estratégia, apenas da equipa adversária?

"Mais vale não defender. Afinal, o que se ganha com isso?", disse-me alguém hoje. 

Eu diria que jogar à defesa é mais seguro. Mas eu sou uma medricas e não entendo nada de futebol.

06/04/2016

Margaritas.

Não venho aqui há muito tempo. É recorrente: sou mais assídua quando a vida me corre muito mal ou muito bem. O assim-assim é morno e não me dá assuntos para escrever.
Sei que tenho leitores novos (ou pensam que depois de um jantar regado a margaritas não mereciam menção no blog??), tenho leitores antigos a reclamar a ausência. Não é que falte tempo: mas falta assunto. A maioria das vezes, o silêncio é a melhor arma.
E, por falar em armas, estou a aprender que ficar à defesa cansa muito. Cansa disfarçar. Mas habituamo-nos a isso com relativa facilidade (há dias melhores que outros, como em tudo). Tornou-se tão mecânico que deixa de ser difícil. Torna-se quase natural. E quase fácil. Mas cansa.

Já dizia o outro que viver todos os dias cansa. E eu já tirava umas férias desta quase vida. Oh se tirava...