28/03/2018

Deixem-me contar-vos um segredo...

Tenho esta página em branco e mil histórias para contar. 
As que posso contar, já toda a gente sabe: são histórias iguais às de toda a gente. Histórias do dia a dia, do rame-rame, as vulgares e sem estória. 
As outras guardo para mim, na esperança de conseguir entendê-las e explicá-las ao mundo. As histórias que ficam escondidas num lugar fundo e escuro. 

Conquistas, desilusões, vergonhas, orgulhos... 
Uma montanha russa que me leva do tudo ao nada em segundos, que me enche e esvazia de repente, que dá prazer e dor logo a seguir. Uma mistura agridoce, quente e fria, confortável e desconfortável ao mesmo tempo. 

Tenho os dias cheios de histórias guardadas e escondidas. Tenho copos meio cheios que continuam meio vazios. Tenho gritos e gargalhadas, mas também tenho lágrimas e lamúrias. Tenho tantas coisas tão boas e outras tantas tão más. Tenho coisas más que são boas e vice versa. E em simultâneo.

Percebo que isto possa não fazer sentido nenhum. Eu ainda estou à procura do sentido. Ou à procura de dar sentido a tudo isto. Mas se há coisa que eu aprendi nestes 40 anos é que, mais tarde ou mais cedo, tudo acaba por fazer sentido desde que sejamos nós a encontrá-lo.

Pensei que os 40 anos fossem um lugar confortavelmente estável.
Descubro, diariamente, que os 40 são inundados de desconfortos infinitamente felizes. 

E eu? Eu sou desconfortavelmente feliz.

22/02/2018

Xia

Foi tudo muito rápido. Acho que isso foi o que me custou mais. Secretamente, guardei até ao fim a esperança de me ver sentada contigo à mesa, no próximo Natal, a rir sobre aquele acidente. Mas isso não vai acontecer. 
Foi tudo muito rápido e inesperado, e eu sempre acreditei que as mulheres fortes como tu fossem imortais. Uma Mulher exemplo para todas as mulheres que te rodearam, que te admiraram, que te conheceram. Não bastava seres aquela força da natureza, ainda eras uma das mulheres mais bonitas que conheci (acho que nenhuma das tuas netas teve a sorte de herdar essa tua beleza). 
Agora, já não estás cá. E isto parece tão irreal como imaginar a tua casa sem um bolo acabado de fazer. Ou um molotov. Ou sem o relógio que fazia música a todas as horas e que o Miguel chamava “o Natal”. 

No outro dia, ao sair da escola, o Manuel olhou para o céu azul. “Não se vê a Xia, Mamã. Como é que vamos conseguir ver a Xia quando tivermos saudades durante o dia? Só à noite é que se vêem as estrelas!” 
Parei, baixei-me à altura dos seus cinco anos, olhei para ele e disse “fecha os olhos com toda a tua força. Toda a força que conseguires”, e ele fechou. “Consigo ver estrelinhas! Afinal, consigo ver a Xia sempre que quiser!”

Foi assim que ensinei aos meus filhos que, apesar de já não estares cá, estarás sempre connosco. Sempre que precisarmos. 

13/01/2018

Até amanhã.

Estava a precisar de um dia como o de hoje.

Os últimos tempos não foram fáceis: o natal é sempre uma época complicada para mim, vivi grandes desilusões, uma perda incompreensível, o acidente da minha Avó... Tudo num espaço de tempo muito curto. Ando sem energia, irritada, revoltada. Ando cheia de frio, a dormir mal, a comer pior. 
Estava a precisar de um dia como o de hoje. Um dia só para mim. Oito horas de puro deleite e cabeça focada naquilo que me dá mais prazer: a Dança. Aulas, ensaios, treinos.

Quem me conhece bem sabe onde é a minha segunda casa. É naquela escola onde me sinto bem, onde recupero as minhas energias, onde penso positivo, onde posso fazer o que mais gosto. Mal ou bem. Melhor ou pior. Posso ser eu ou posso representar: uma bailarina elegante ou um guarda furioso. E foi aquela escola que deu origem aos meus três bens mais preciosos: os meus filhos.

Agora, sentada às escuras no meu quarto, num silêncio calmo e relaxado, pronta para dormir, sinto que exorcizei todos os desgostos dos últimos tempos. Sinto-me descansada e feliz. Sinto-me só mas completa. 
Amanhã, não sei: talvez o cinzento volte a toldar a minha vontade, talvez o brilho irradie. 
Mas hoje... hoje foi um dia branco de esperança e de paz.

Até amanhã.

17/12/2017

O vazio que não se (pre)enche.

Esse vazio existe. É real. Palpável. Vê-se, toca-se, sente-se, cheira-se. Aquele vazio de que falei por aqui uma vez: às vezes magoa, outras vezes é a única companhia que resta.

Podes tentar encher esse vazio. Com actividades, corridas, ginásio, festas, passeios, cinema, museus, dança. Funciona como um funil: enches de um lado mas acaba por sair do lado oposto. O vazio permanece.

Podes fingir que não existe. Olhas para ele de manhã com desdém, sente-lo durante o dia, espreita-lo pelo canto do olho de vez em quando. Ris e conversas como se ele não estivesse ali. Mas à noite, quando chegas a casa, não consegues deixar de tropeçar nele logo à porta.

Podes enchê-lo com pessoas. Mas não seria justo usá-las para preencher as tuas lacunas. Tal como não podes encaixar num puzzle de 1000 peças uma peça de outro jogo. Se perdes a peça, estragas o jogo; tenta não estragar os dois jogos.

Talvez esse vazio vá sempre existir. E resta-te viver a vida com ele a teu lado: aquela nuvem escura que paira em cima da tua cabeça. Mas escuta: atrás dessa nuvem, o sol brilha. Brilha sempre!

Hoje, o dia está gelado, o Natal está à porta e o céu está daquele azul que mais gostas. Olha para cima. Consegues ver, não consegues?
Por isso, agarra nesse vazio com carinho. Ele faz parte de ti agora. Agarra-o bem junto ao peito, senta-te no sofá com a manta nos joelhos, liga a televisão e, com o chá a aquecer-te as maos e a alma, vive o teu domingo até adormeceres.

Vai ficar tudo bem...

08/11/2017

Promessas

Desta vez, vai ser diferente.

Promete que não vais tratar-me bem, não vais fazer juras de amor eterno, que não vais fazer-me rir. Promete que não vais dizer que sou a melhor do mundo. 
Promete que não vais mandar mensagens de manhã que me vão fazer sorrir. Promete que não pensas em mim antes de adormecer.
Promete que não vamos passear de mãos dadas por Lisboa. Que não vamos ver o sol a pôr-se no mar. Nem vamos esperar para o ver nascer, ainda embrulhados em gargalhadas e álcool. 
Promete que não me vais oferecer flores nem memórias nem carinhos. 
Promete que não vais fazer-me sentir mulher outra vez, que não vais olhar para o mais profundo dos meus olhares, que não vais descobrir-me devagarinho, sem pressa, como se o mundo lá fora não existisse. 
Promete que não me vais mentir.

Sobretudo, por favor, promete-me que não vais fazer promessas.

07/11/2017

Ternura dos 40

Ao ler esta manhã o post da Lénia* sobre a sessão fotográfica (que ADOREI, btw), fez-me perceber com clareza o que é isto da "ternura dos 40" que os nossos pais cantavam quando éramos miúdos. Não sei se os homens sentem o mesmo, mas estou mesmo convicta que isto de ter 40 anos traz às mulheres a segurança, a maturidade e a aceitação que mais nenhuma idade nos traz.
Uma coisa é estarmos a viver o nosso corpo com 40 anos; outra é vivermos o nosso corpo com 20, 25 ou 30 anos. E quem diz o corpo diz a maneira de estar, de sentir, de opinar ou até de falar. Eu vejo isso nas minhas relações (amorosas e não só), na maneira como vivo o meu dia-a-dia, no meu emprego, na minha família. Sinto mesmo muita diferença, até porque também tenho uma capacidade analítica muito maior agora.
Sem dúvida, o ponto de viragem na minha vida foi o divórcio. Se não tivesse acontecido, com certeza eu não teria a capacidade de auto-análise que tenho agora, a capacidade de aceitação e, como é óbvio, o tempo e a disponibilidade para pensar neste tipo de coisas. 

Uma das melhores sensações é estarmos bem connosco. É olharmos para o espelho e gostarmos do que vemos: tenha mais ou menos celulite, tenha mais ou menos barriga. Isso não interessa nada porque não é a celulite ou a barriga que nos define. É libertador quando percebemos isso. E é angustiante perceber o tempo que gastamos com o foco no lugar errado. 

Hoje, disseram-me "és tão genuína..." e eu entendi isto como um elogio. Nem sempre fui assim. Passei tempo demais na minha vida preocupada em ser aquilo que os outros esperavam que eu fosse, esquecendo o mais importante: Eu.



*Desculpa, Lénia: sei que ainda te falta algum tempo para chegar os "entas", mas percebe que isto não acontece de um dia para o outro. É antes um work-in-progress.

17/10/2017

Histórias de amor

Há histórias de amor que não terminam. Ficam suspensas no ar como um suspiro que alguém soltou. Como uma palavra que não foi dita. Como uma folha que caiu da árvore mas não chegou a tocar no chão. Como se alguém tivesse tocado no botão da pausa sem querer e a cena ficasse ali: suspensa. 

Retida. 

Congelada.

As histórias de amor que não terminam são as que magoam mais. Magoa o "e se?". Magoa muito o que não chegou a ser dito. Magoa a falta de coragem para enfrentar. Para pedir justificação. Magoam as perguntas que não se fizeram e as respostas que ficaram por dar. Doem porque não se percebe. E porque dói olhar todos os dias para um ecrã de telefone com a mensagem escrita sem coragem para tocar no enviar.

Todos os dias.

O cursor a piscar.

As histórias de amor que não terminam doem muito porque, como todos sabemos, a ausência do fim é, por si só, o próprio fim.


13/10/2017

2 anos

Foi há dois anos. 
Foi há dois anos que a vida deu aquele piparote com mortal encarpado atrás e aterrou de lado deixando tudo do avesso. E por muita paz que esteja agora a sentir, volvidos estes 730 longos e preenchidos dias, não consigo deixar de sorrir ao perceber que hoje é sexta-feira, 13 e que saí de casa com os putos deixando o telefone, a carteira e as chaves no lado de dentro. 

Podia ter ficado preocupada? Claro que podia. Mas sorri, levei os miúdos à escola a pé, com aquela calma de quem tem qualidade de vida e até está de folga, e, no caminho, entre gargalhadas de uns e resmunguices de outros,  tive a certeza que estou no sítio certo, na altura certa, a fazer a coisa certa. 


18/09/2017

Perguntas.

A minha cabeça está cheia de perguntas. Perguntas que me perseguem, umas que me atormentam, outras que só me acompanham. Umas tiram-me o sono, outras levam-me às lágrimas. Umas que, tenho a certeza, farei um dia, outras que morrerão sem resposta. Umas mais simples, outras mais complexas.
Podia fazer aqui uma lista, mas são tantas e, cada uma delas, dirigida a uma pessoa diferente. Trazê-las para aqui não lhes vai dar respostas.

(Será que quero saber as respostas?)

Um dia, quando tiver coragem (ou quando perder o filtro), faço-as todas de rajada. Como as metralhadoras. 

Entre mortos e feridos, alguém há-de escapar. 


16/09/2017

Das dores boas.

O Ballet recomeçou há pouco mais de 15 dias: barra de chão, como todos os meses de setembro. Eu, que não parei nas férias (corridas, caminhadas, exercícios em casa), percebi que os meus abdominais foram esquecidos. Coitados. O que eles sofreram naquela hora.

Na quarta feira passada, ainda doridos, foram massacrados em mais uma aula de barra de chão. Esforcei-os ainda mais e eles ressentiram-se: doía-me só de tocar. 

Não contente com isso, quinta feira fui correr em passadeira. Experiência nova para mim, mas até nem desgostei. Acordei no dia seguinte com ainda mais dores nos abdominais e umas dores novas nos gémeos. Como doíam...

Não contente com isso, hoje de manhã decidi que seria uma boa ideia fazer outra aula de barra de chão.

À tarde, tive um ataque de tosse.
Ia morrendo.


11/09/2017

Como já devem ter percebido, o Facebook está démodè.

Ah, não sabiam? Apanhei-vos desprevenidos? Ainda usam o FB como a rede social por excelência? Pois é. O FB está moribundo e completamente fora de moda. Agora, o que está a dar é o Instagram. Isto é uma verdade absoluta e, se não acreditam, perguntem a qualquer pessoa com menos de 20 anos e ela confirmar-vos-á.
Adiante...
Tenho passado algum tempo a passear no Instagram, sobretudo nos meus tempos livres. (Ahahahah!, tempos livres... Tão gira, a míúda a dizer piadas!). Se carregarem naquela lupa em roda pé da aplicação, surge todo um mundo novo de contas Instagram de pessoas mais ou menos conhecidas, mais ou menos bonitas, mais ou menos interessantes, mais ou menos fúteis, com mais ou menos conteúdo. Ali, aparece de tudo.
A conlcusão a que chego é que, para teres uma conta Instagram da moda, tens de andar sempre acompanhada por alguém que te tire fotos. De preferência, daquelas fotos em que parece que estás à procura da moeda que deixaste cair, ou que estás desprevenida a rir para o ar, ou ainda daquelas em que apareces acabada de acordar (sem olheiras, sem mau hálito e sem as marcas do lençol na cara, como é óbvio).


Óbvio também é que eu quero ter uma conta de Instagram da moda! (Btw, diz-se conta ou perfil? Respostas nos comentários, por favor.) Para isso, tenho de aparecer a olhar para o chão, a rir para o ar ou, a cereja no topo do bolo, com uma bóia em forma de flamingo numa piscina qualquer (esta última, foi logo descartada por falta do requisito principal chamado, lá está, piscina). Para tirar as outras, e como os caríssimos leitores bem sabem, tive que contar com a ajuda de três crianças, com idades entre os 3 e os 7 anos, e os seus belíssimos dotes fotográficos.



Vá, digam lá de vossa justiça. Não nos saímos muito mal, pois não?

10/09/2017

O regresso

Cinco meses depois, o regresso.
As férias acabaram, os sonhos morreram, as borboletas foram enterradas.
A rotina voltou, os miúdos estão enormes, setembro chegou cheio de novidades.

Respondendo ao pedido de várias pessoas durante estes cinco meses, vou tentar voltar.
Não vos prometo assiduidade, qualidade, quantidade. Não vos prometo boa disposição todos os dias. Nem prometo o mau feitio regular. Prometo, sim, voltar a usar a Casca como o refúgio que é desde 2003.

Já tinha saudades.

Stay tuned!

09/09/2017

Quimeras.

É perigoso sonharmos ser mais do que aquilo que podemos ser. "A morte de um sonho não é menos triste que a própria morte*" e eu já estou cansada de enterrar quimeras.
A maldição da mulher moderna é esta mesmo: foi-nos dada a ilusão que podíamos ser o que quiséssemos: óptimas profissionais, excelentes mães, esposas perfeitas, donas de casa exemplares. E com tantas bolas no ar neste malabarismo patético, há sempre alguma que cai ao chão. Ou mesmo no meio da tua testa.
"Não te preocupes, vais refazer a tua vida com alguém". Como se uma vida refeita tenha, obrigatoriamente, que passar pelas mãos de outra pessoa. Como se fosse fácil ter espaço para um emprego e filhos e casa e uma vida pessoal. Como se fosse dado a escolher "com quem é que agora queres passar o resto dos teus dias?". Como se fosse uma escolha só nossa. Como se o dia tivesse 50 horas. Como se fosse possível. Como se fosse fácil.

Sonhar é fácil
Difícil é sobreviver aos sonhos.


* Frase de António Lobo Antunes que eu costumo usar muito.

11/04/2017

Dave Matthews

A  minha vida tem uma banda sonora. Sempre teve. Sempre associei músicas a fases da vida. Ou a pessoas. Ou a momentos. Desde o Phil Collins que lembra o primeiro beijo, no 8º ano, os GNR e o primeiro concerto em Alvalade, os Guns & Roses e a primeira paixão platónica. Os Pearl Jam no início dos 20 anos, os Smashing Pumpkins e a descoberta do meu lugar neste mundo e tantos, tantos exemplos.
Ouço Dave Mathews há muito tempo. Foi a música da minha primeira casa, onde vivi sozinha durante 5 anos. E por essa música me apaixonei nessa altura. Talvez antes, até. 
Há uns tempos, Dave Mathews passou a ser a banda sonora do pior dia da minha vida: vinte e quatro horas de medo, de desnorte, de desilusão. E deixei de o ouvir. Como se calando aquela música, conseguisse apagar aquele dia de outubro. Não apagou. Nunca vai apagar. Mas hoje entrei no Coliseu com vontade de ver e ouvir a minha música. Sem barreiras, sem memórias, ouvir e ver aquele que foi minha companhia (e tão boa) durante tantos anos. 
Ainda bem que fui: foi o concerto da minha vida! Dave Mathews voltou à playlist dos meus 40 anos. Voltou ao top 3 na tabela. Voltou a ser banda sonora, mas desta vez só de coisas boas. 
Porque as feridas são feitas por pessoas. As músicas são só parte do cenário que criamos à nossa volta. 


22/03/2017

Como encarar uma tarde de neura.

Uma pessoa está com a neura numa tarde de domingo e cruza-se com uma receita que parece deliciosa. 
Sai de casa e compra os ingredientes pra fazer enroladinhos de massa filo com espinafres e queijo feta. 
E sobra massa filo.
Então, uma pessoa vai à net procurar receitas doces com massa filo.
E cruza-se com uma receita que parece deliciosa. 
Sai de casa e compra os ingredientes para fazer enroladinhos de massa filo com batata doce e açúcar e ovo.
E sobra recheio.
Então, uma pessoa vai comprar mais massa filo e não encontra: compra massa folhada para o resto do recheio.
E sobra massa folhada.
Então, uma pessoa vai à net procurar receitas doces com massa folhada.
E cruza-se com uma receita que parece deliciosa. 
E faz folhados de maçã e canela com gengibre.

Conclusão: estar com a neura engorda.

20/03/2017

O inverno acabou.

Foi um longo inverno. Diria mesmo que foi o inverno mais longo. O Natal durou uma eternidade. Fiz 40 anos. Passei a dormir. Deixei de correr. Deixei de escrever. Estou mais calma. Acompanho mais os miúdos: brinco mais, converso mais, passeamos mais. Graças à ajuda da minha Mãe: sem ela não conseguia. Recomecei os ensaios. Cozinho mais e melhor. A casa anda mais organizada. A minha cabeça também. Peso mais. Falo menos. Falo muito menos.
A pior solidão é aquela que se sente mesmo rodeado de pessoas. De amigos, de família. Tive uma festa de 40 anos com 30 pessoas. Amigos com A grande. Aquelas pessoas que estiveram comigo no último ano e graças a quem eu continuo com a cabeça em cima dos ombros. Foi uma noite do caraças. No dia seguinte, voltou aquela dor. A dor do escuro, do silêncio, do vazio. A dor do nada. Do só.
Já faz parte de mim, essa solidão. Já me acompanha. A solidão agora é a minha companhia. Há dias piores. A maioria vão-se vivendo. O inverno terminou hoje. Esteve sol, cheirou-me a flores no caminho de casa, o vento sopra fresco. Talvez assumindo se torne mais leve. Quem sabe se a partilhar, ela se torne mais fácil de carregar. A solidão.
A primavera está aí. Não tarda, chegará o verão. E no verão, tudo fica mais fácil de suportar. 
Eu sei. Já lá estive.

11/12/2016

Factos aleatórios que me aconteceram na última semana - 2

- Percebi que as mamas do professor de natação do António são maiores que as mamas da professora de natação do Manu.

- Comi sushi, o que já não acontecia há muito tempo. Há tanto tempo que, a última vez que comi sushi, ainda era casada.

- Demorei três horas a chegar a casa: Natal, jogo do Benfica e inverno são ingredientes para uma boa dose de falta de paciência.

- A regra "não se come no carro novo" durou apenas 3 semanas, graças aos três ingredientes da alínea anterior.

- O sol voltou e eu fiquei muito feliz.

- Encontrei, perdida da arrecadação, uma caixa de roupa de rapaz 3-4 anos (de inverno), o que veio mesmo a calhar. Foi quase tão bom com encontrar uma nota de 20€ naquele casaco que não usamos há anos.

- Montamos a árvore de Natal, como sempre, no dia 1 de Dezembro. O Manu insiste em falar da NAVE de Natal e, quando corrigido, olha para o adereço com aquela cara de quem está a perceber perfeitamente a correcção. Apesar da inteligência do petiz, a sua memória deve ser igual à da sua Mãe porque, daí a pouco tempo, lá está ele outra vez a falar da NAVE de Natal.

- No oitavo dia de Dezembro, tinha comprado todos os presentes de Natal. Todos os três.

(Com o sucesso que esta rubrica teve na primeira edição, quase me passou pela cabeça fazer um jingle e tornar-me uma youtuber. Quase!)

06/12/2016

Mãe Cansada.

Será uma Mãe cansada uma boa Mãe?
A Mãe cansada não tem paciência para nada, principalmente para os filhos. O que até nem faz sentido, porque uma Mãe cansada não deixa de ser Mãe. Não tem vontade de brincar, nem de cozinhar, nem de tratar do ninho. Os banhos são dados com sacrifício porque, fisicamente, é a tarefa mais dura da maternidade. Pelo menos, para esta Mãe cansada que já tinha problemas nas costas ainda antes de ser Mãe.
A Mãe cansada não tem forças para contar histórias de embalar. Aliás, a Mãe cansada costuma adormecer antes dos filhos. E, quando acorda toda torta no meio dos minis, muitas vezes às duas ou três da manhã, ainda vai arrumar a cozinha, estender uma máquina de roupa ou fazer o jantar do dia seguinte. Porque, no dia seguinte, quando a Mãe cansada chegar a casa com os filhos, já é hora do jantar.
A Mãe cansada só pensa em dormir. Mas as noites são interrompidas por tosses, febres, pesadelos ou apenas por mãos pequeninas a pedir para dormir na cama grande. E, quando não há filhos para interromper o sono, o sono é interrompido pelas insónias: medos, preocupações ou apenas aquelas palpitações que teimam em aparecer de vez em quando. 

A Mãe cansada não pode ser uma boa Mãe. Mas é a única Mãe que sabe ser quando o cansaço não a deixa ser uma Mãe feliz.

01/12/2016

Surf

Há oito anos, surfava pela última vez nesta mesma praia. Se há coisa que eu sinto saudades é de entrar num mar fresquinho no inverno. 
Ao contrário do meu irmão, nunca fui boa no surf. Nunca entrei dentro de água só pelo desporto, mas pela ligação com o mar. Isso era o mais importante. Continua a ser. E adorava aquele chá que bebia logo depois de me vestir, cheia de roupa quente e com o cabelo ainda molhado. 
Hoje, olho lá para fora e o dia está praticamente igual àquele dia, na Arrifana, há 8 anos: frio e chuvoso. É o primeiro dia de dezembro e há outros rituais a cumprir. Hoje, pego nos meus filhos e vamos montar a árvore de natal. 
Mudam-se os tempos, mudam-se os rituais, mudam-se as pessoas... A minha vida é boa hoje, como era há oito anos. 
Espero que, daqui a oito anos, um dos meus filhos me peça para o levar à praia de manhãzinha, porque é exactamente àquela hora que as ondas vão estar perfeitas.


29/11/2016

Factos aleatórios que me aconteceram na última semana - 1

- Irritam-me as meias curtas que ponho dentro das botas, porque se enrolam todas nos dedos dos pés. Se, na verdade, eu uso aquelas meias quando uso saias só para aquecer os pés, ficando enroladas elas deixam de ter utilidade (a não ser causar-me bolhas e calos). Ainda assim, não deixo de as usar.

- As birras do Manu param automaticamente quando ouve as palavras "Pai Natal".

- Foram precisos 2 GPS's para chegar de Palmela à Aroeira e nenhum reconhecia a A33, o que fez com que eu tivesse a agradável sensação de pairar num buraco negro do sistema solar durante uns bons 20 minutos.

- Fui à Black Friday sem perceber que era Black Friday (nem mesmo depois de ver o Dolce Vita Tejo com mais gente que o santuário de Fátima no 13 de Maio) e até disse à senhora da Mango que talvez estivesse enganada no preço da carteira que marcava 19,99€ e ela estava a cobrar-me 15,99€.

- Descobri que o desenho feito pelo mármore, no segundo degrau do prédio dos meus Pais, faz lembrar um porco. Eles vivem naquela casa há 36 anos. Eu devo ter passado por aquele degrau centenas de milhares de vezes elevado a infinitos. Nunca tinha reparado.

- As  missas são dadas da mesma maneira há séculos e, mesmo tendo ficado sem entrar numa igreja durante uns largos 5 anos, descobri que anda há quem diga "ouvimos Senhor".

- Os meus filhos não sabem quem é Jesus nem para que serve uma igreja. E eu não sei explicar-lhes.

- Percebi que vou fazer 40 anos em breve e que tenho duas opções: ou festejo até cair para o lado ou hiberno até à primavera.

Esta é a nova rubrica da Casca, para ver se põe isto a mexer outra vez. Será actualizada semanalmente e é sobre... nada. Basicamente, nada. 
Espero que gostem!

13/10/2016

365 dias.

Há datas que se comemoram.
Há datas que se assinalam. 
Há datas que se esquecem.
Há datas que nos marcam. 

28/09/2016

Foca-te.

Às tantas, olhas no espelho e as tuas olheiras dizem-te que andaste focado tempo demais nos assuntos errados. Que o verão já acabou e o tempo não volta atrás. Que os dias estão a ficar mais curtos e as noites mais longas. Percebes que não valeu a pena aquele tempo perdido e sentes-te a pessoa mais ridícula do mundo. Sentes necessidade de ajustar o foco. O jogo de cintura. Ponderar os passos, em vez de te deixares ser arrastado pela corrente. E, quando finalmente tomas as rédeas da tua vida outra vez, recuperas o tempo, aproveitas as noites, vives melhor os dias. 
E sorris. 
Sabes: podes já não te lembrar disto, mas quando olhas no espelho e sorris, o espelho dá-te o sorriso de volta. 


17/09/2016

Voltar ao sítio onde fui feliz?

Hoje, fui lanchar à Neusa.
Sabes o que isto significa, não sabes?
Não foi só o lanche na Neusa. Foi ter passado na rua. Foi ver as casas todas. Foi a Fofa e a Tita. Foi o Sr. Guedes e a D. Alda. Foram as aulas de condução que dei. Foram os lanches que íamos comprar ao super, que tinham sempre litradas sumo Ika. Foi o Vasco, o Chico, o Pita, o João, a Iris, a Marta, o Chué. Foi o Mirc e a novidade da internet. As idas ao cinema nas Amoreiras. Foram as aulas que faltei na faculdade para ir ao intervalo grande na ESBA. Foi o Dragon Ball. Foi Pearl Jam. Foi Mini Drunfes. Foi apanhar as músicas na guitarra. Foi fazer nada na casa de um ou de outro. Foram as tardes na casa de Algés. Foram as idas à praia no 127 do Miguelão (8 pessoas mais um cão) e ficar debaixo da bola Nívea. Foram jogos de futebol no descampado, a filmagem da história policial, as concentrações de bicicleta. Foram as idas ao aeroporto esperar a Tia Graça. Foi a Leça. Foram as passagens de ano. Foram os beijinhos escondidos. Foram os jantares no Mac e as idas ao Oeiras Parque quando aquilo era a novidade. Foi a viagem a Phoenix, o deserto, o Dave, o Montezuma Castle, o Seven Eleven, as Harleys, o Grand Canyon ali tão perto. 
Foi voltar ao sítio onde fui mais feliz.
E foste, principalmente, tu. Sabes o que significa, não sabes?

07/09/2016

Dos sonhos.

Altura, Algarve. Julho, 36º, mar quente, vento fraco. areia morna. Corpos bronzeados.
De repente, estou na praia, dentro de água, com os meus filhos. Todos os três. Nenhum a chorar ou com medo ou contrariado. Estão felizes e ouvem-se gargalhadas e gritos de excitação. 
Voltem a ler o parágrafo anterior, por favor. Aqueles que conhecem os meus filhos pessoalmente e há mais tempo: voltem a ler. 
Quais noites de sono interrompidas. Quais xixi e cocós fora do bacio. Quais autonomia, birras, choros  ou doenças. Naquele momento, estava a realizar um dos sonhos da minha vida. Naquele momento, tudo o que há de menos bom na minha experiência no mundo da maternidade, foi imediatamente esquecido. 
Eu estou na praia, dentro de água, com os meus filhos. Eu estou a brincar na água do mar com os meus três filhos.
A felicidade existe e estava ali mesmo, naquela praia.


A emoção foi tanta, que não me lembrei de registar o momento.
Fica esta lembrança, só com os rapazes.

20/08/2016

Desistir? Agora é tarde demais...

Houve momentos em que a desilusão era tão grande, a tristeza tão profunda, era tanto o desapontamento, que eu não queria sequer acordar. Nem comer. Nem respirar. Nesses dias, ia buscar forças a uma paixão maior e seguia para mais um ensaio. Houve dias em que estive quase a ser vencida pelo cansaço e pelo desânimo, dias que fui sem comer e sem dormir.

Foto: Carmo Sousa na Escola de Dança Ana Kohler, algures entre Novembro 2015 e Maio 2016


Quando olhei a primeira vez para esta foto, pensei "porque é que não desisti?" Era tão mais fácil esconder-me durante aqueles fins de semana, fechar-me todos os sábados e todos os domingos, isolar-me e não me mostrar a ninguém. Eu fui. E todo o processo teve tanto de sofrido como de prazeroso. Tanto de sacrifício como de deleite. Saiu-me do corpo como sai um filho.
Quando vi esta foto de cima pensei como fui capaz de continuar. Mas a verdade é que em momento algum pensei em desistir. Simplesmente, essa ideia não me ocorreu. Quando vi esta fotografia e me lembrei que essa poderia ser uma saída, já tudo tinha acabado: a montagem, os ensaios, o espectáculo.

Depois, olho para a foto de baixo. A foto que não precisa de palavras. Não precisa, pois não?

Foto: Jorge Chincho Macedo no CCB, 5-6-2016